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ACORDO ENTRE BRUXELAS E TRUMP "NÃO FOI CAPITULAÇÃO, FOI CONTROLO DE DANOS", AFIRMA O ECONOMISTA ALEMÃO ACHIM WAMBACH

Expresso Online

2025-08-21 21:04:35

O acordo na Escócia "evitou o pior cenário", mas sinalizou "uma certa aceitação" por Bruxelas de uma política de Washington baseada no poder, diz o presidente do centro alemão de investigação económica ZEW, em entrevista ao Expresso O aperto de mão entre Donald Trump e Ursula von der Leyen foi uma capitulação da Comissão Europeia em solo escocês? Não foi nem um triunfo nem uma capitulação. Foi uma operação de controlo de danos. Evitou o pior cenário de imposição de tarifas generalizadas. Mas também sinalizou uma certa aceitação, por parte da União Europeia, de uma política de comércio internacional norte-americana cada vez mais transacional e baseada no poder. Mas isso não foi efetivamente uma derrota? Face ao sistema baseado em regras da era pré-Trump, isso representa um retrocesso. Quem saiu beneficiado entre os exportadores europeus? O sector automóvel, a eletrónica e os equipamentos de transporte foram dos mais beneficiados pela redução ou eliminação de tarifas. E os mais prejudicados? Pelo contrário, sectores como a indústria farmacêutica, química e dos metais poderão enfrentar as maiores quebras de produção. As perspetivas para a indústria farmacêutica são particularmente preocupantes, pois pode sofrer ainda mais se os EUA optarem por impor novas tarifas específicas sobre o sector. Quais são os pontos fortes da União Europeia (UE) neste novo quadro de competição comercial? A diversidade interna e a tomada de decisão por consenso na UE, consideradas frequentemente como fraquezas, são, de facto, uma vantagem estratégica. Em que sentido? Ao contrário de potências mais centralizadas, a estrutura pluralista da UE reforça a sua credibilidade como um mediador nos assuntos internacionais. Aquele equilíbrio institucional torna a UE um parceiro fiável e estável, bem posicionado para construir novas alianças e fomentar a cooperação num quadro global cada vez mais fragmentado. "Ao contrário de potências mais centralizadas, a estrutura pluralista da União Europeia reforça a sua credibilidade como um mediador nos assuntos internacionais" O défice dos EUA com a UE pode diminuir substancialmente até ao final do mandato de Trump graças às promessas de compras europeias de energia e de armas? É duvidoso que o excedente que a UE regista com os EUA se reduza substancialmente até 2028, e ainda menos provável que isso venha a ser o resultado das intenções iniciais de Trump. Em que baseia esse prognóstico? Para antecipar desenvolvimentos futuros, é útil olhar para os resultados do primeiro mandato de Trump. Apesar dos esforços para reduzir as importações do estrangeiro, o défice comercial em produtos aumentou em 21% entre 2016 e 2020. O défice conjunto nas balanças de produtos e de serviços aumentou cerca de 198 mil milhões de dólares (EUR174 mil milhões, ao câmbio médio de 2020). O quadro de políticas, usando as tarifas como instrumento mais importante, fracassou nos resultados pretendidos. Na realidade, o grosso das tarifas foi repercutido nos consumidores norte-americanos e nas indústrias importadoras, resultando numa perda económica líquida de 7,2 mil milhões de dólares (EUR6,3 mil milhões). E a promessa de Bruxelas de forte investimento nos EUA, deslocalizando da Europa? Primeiro há que referir que Trump não compreende o impacto do investimento direto estrangeiro (IDE) nas balanças comerciais. Pelo contrário, o aumento do IDE - como os 600 mil milhões de dólares (EUR513 mil milhões ao câmbio atual) anunciados por parte da Europa - pode até ampliar o défice norte-americano. Só uma depreciação sustentada do dólar, que, aliás, está a acontecer em resposta às políticas erráticas de Trump, poderá efetivamente reduzir o défice comercial. A promessa de investimento nos EUA por parte de Bruxelas é mesmo para cumprir? Essas promessas de investimento não são compromissos vinculativos, e a decisão de investir ou relocalizar a produção é, em grande parte, determinada por empresas privadas. Um inquérito recente mostra que muitas empresas alemãs estão a reter ou a abandonar investimentos nos EUA. Podem ocorrer relocalizações em setores específicos, como no caso da Mercedes, que está a expandir a sua produção nos EUA, e da Porsche, que está a considerar as fases finais da montagem lá. Mas a incerteza sobre os EUA enquanto parceiro comercial pode levar as empresas a optar por locais alternativos. Muitas empresas alemãs já estão a expandir a sua presença na Europa de Leste. Trump sempre se "esquece" de referir que os EUA registam um excedente comercial com a UE nos serviços. No ano passado foi de quase 90 mil milhões de dólares (mais de EUR80 mil milhões, ao câmbio da altura). Bruxelas deveria ter tomado medidas nesse campo? Muitos economistas criticaram, de facto, a UE por dar pouca importância aos serviços na negociação. O sector de serviços já pesa quase tanto como o dos produtos no comércio bilateral. As taxas norte-americanas, até agora, só visam o sector de produtos. Uma resposta abrangente de Bruxelas poderia ter refletido a importância crescente do comércio nos serviços. Jorge Nascimento Rodrigues Jornalista Jorge Nascimento Rodrigues