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DESCONFIANÇA TRAVA CRIAÇÃO DE EMPRESAS E AUMENTA FALÊNCIAS

Plataforma Online

2025-08-18 21:06:43

No primeiro semestre de 2025, Macau registou 469 empresas dissolvidas - o valor mais alto da década - e apenas 2020 novas sociedades, o número mais baixo desde 2016. Para o economista Henry Lei, "os setores não relacionados com o turismo, em especial o retalho, continuam a enfrentar uma situação crítica, uma vez que a confiança dos consumidores permanece fraca" 3 O primeiro semestre de 2025 foi o mais negativo dos últimos dez anos no balanço da constituição e dissolução de empresas em Macau. Entre janeiro e junho, encerraram 469 empresas - mais 5% do que no mesmo período do ano passado - e foram constituídas apenas 2020 novas sociedades, o valor mais baixo desde 2016. Apesar disso, o saldo líquido manteve-se positivo, com mais empresas criadas do que dissolvidas. Apesar do saldo positivo - mais empresas criadas do que dissolvidas -, o economista Henry Lei alerta que este dado não deve ser interpretado como sinal de vitalidade económica. "Algumas empresas optam por não cancelar o seu registo, mesmo após cessarem a atividade, porque manter o registo não implica custos e garante maior flexibilidade. É por isso que existe sempre um saldo positivo. Mas as estatísticas mensais mostram uma tendência de queda nas constituições e de aumento nas dissoluções, reflexo das incertezas económicas e da redução da confiança dos consumidores". De acordo com a Direcção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC), o capital social das empresas criadas no primeiro semestre do ano totalizou 303 milhões de patacas. A criação de empresas caiu 12% em comparação com 2024 e 38% face ao período pré-pandemia, em 2019, ano em que nasceram 3.278 sociedades. Desde 2023 que a tendência é de descida contínua. Para o economista Henry Lei, estes números refletem um processo de recuperação económica desigual: "O desempenho global da economia de Macau mostrou sinais claros de recuperação no segundo trimestre e no primeiro semestre de 2025. No entanto, o desenvolvimento entre os vários sectores está desequilibrado, com o turismo e o Jogo a liderarem o ritmo de recuperação, beneficiando do aumento do número de visitantes e de receitas brutas de Jogo acima do esperado. Os setores não relacionados com o turismo, em especial o retalho, continuam a enfrentar uma situação operacional crítica, uma vez que a confiança dos consumidores permanece fraca". Enquanto pequena economia aberta e fortemente dependente da procura externa, Macau é sensível ao comportamento mais conservador dos turistas, que se traduz numa queda da despesa média por visitante. Isto reduz o rendimento da população local e deteriora a procura interna, afetando diretamente o número de empresas criadas e dissolvidas Henry Lei, economista Lei atribui a queda na criação de empresas às mesmas causas: "A diminuição do número de empresas recém-constituídas deve-se às incertezas no ambiente empresarial e à fraca confiança dos consumidores. Os fundamentos económicos sofreram alterações estruturais durante a pandemia, especialmente nos setores do Jogo e do turismo, com enfraquecimento da confiança de consumo interno e externo, maior incentivo para o consumo online e no exterior, e uma sensibilidade acrescida ao preço. Tudo isto fez com que o ambiente de negócios atual seja completamente diferente do período pré-pandemia". Henry Lei destaca ainda a importância dos fatores externos: "Enquanto pequena economia aberta e fortemente dependente da procura externa, Macau é sensível ao comportamento mais conservador dos turistas, que se traduz numa queda da despesa média por visitante. Isto reduz o rendimento da população local e deteriora a procura interna, afetando diretamente o número de empresas criadas e dissolvidas. Considero que os fatores externos têm mais peso do que os internos. As políticas e estímulos locais são implementados pontualmente para atenuar os efeitos adversos causados por perturbações externas, e há possibilidade de que certas orientações políticas do Governo da RAEM, para promover o desenvolvimento de determinados setores, possam estimular a criação de novas empresas nesses ramos". Quanto a soluções, o economista considera que "tudo se resume à questão fundamental de como melhorar o ambiente económico e empresarial global de Macau para apoiar as empresas, especialmente as PME, que são mais vulneráveis. Não se trata de uma tarefa simples ou imediata e exige um conjunto de políticas coordenadas para estimular a procura externa e interna - redução de impostos, subsídios financeiros, simplificação de políticas e procedimentos administrativos - acompanhadas de subsídios fiscais temporários para apoiar as empresas". Consumo em queda A professora da faculdade de Economia e Direito da Universidade de São José (USJ), Florence Lei, analisa a situação a partir da evolução do consumo, citando o mais recente Inquérito às Despesas e Receitas Familiares da DSEC, relativo ao ano passado, que mostra que várias rubricas registaram quebras, incluindo vestuário e calçado, habitação e combustíveis, serviços e artigos domésticos, recreação, desporto, cultura e educação. Por outro lado, aumentaram as despesas em alimentação e bebidas não alcoólicas, bebidas alcoólicas e tabaco, saúde, transportes, informação e comunicação. Importante também salientar que o consumo dos residentes fora de Macau tem aumentado. "Verifica-se uma diminuição no consumo de bens e serviços que não são considerados essenciais ou que chegam a ser vistos como artigos de luxo, uma tendência semelhante à observada a nível global", explica Florence Lei. Segundo a académica, "a confiança dos consumidores nos principais mercados mundiais atingiu mínimos históricos e não regressou aos níveis anteriores à Covid-19", devido a fatores como "tensões geopolíticas globais, incerteza financeira e riscos para a saúde". Se as perdas não superam os custos fixos, como a renda, as empresas mantêm-se a funcionar; no longo prazo, quando os contratos de arrendamento terminam, os negócios não rentáveis encerram Florence Lei, professora na USJ A académica sublinha também as mudanças geracionais: "A Geração Z sente-se menos atraída por produtos de luxo tradicionais e está mais envolvida no comércio eletrónico." Em Macau, estes fatores juntam-se à "concorrência crescente das regiões vizinhas, tanto em preços como em qualidade", o que "pode afetar gravemente o setor retalhista local". No curto prazo, diz Florence Lei, "se as perdas não superam os custos fixos, como a renda, as empresas mantêm-se a funcionar; no longo prazo, quando os contratos de arrendamento terminam, os negócios não rentáveis encerram". Num mercado com entrada e saída livres, "não surgem novas empresas se as existentes estão a operar com prejuízo" e, em contexto competitivo, "apenas os mais fortes sobrevivem". Apesar do cenário adverso, a académica acredita que a diversificação económica pode criar novas oportunidades: "Enquanto alguns setores abrandam, outros podem emergir e trazer novas empresas em fase de arranque. As que se revelarem pouco competitivas num determinado setor terão de se adaptar e transitar para novos negócios. A capacidade de adaptação às mudanças constantes, sobretudo aos avanços tecnológicos, é a regra de sobrevivência no mundo empresarial atual". Gonçalo Lopes