ELÉTRICOS - O QUE ESTÁ A MUDAR NA MOBILIDADE DO FUTURO
2025-08-07 21:08:03

Até ao final de 2026. os postos de carregamento de carros elétricos passarão a disponibilizar o preço por kWh e o pagamento poderá ser feito por cartão de débito ou crédito. A mobilidade elétrica continua a ganhar adeptos, mas muitas marcas ainda lutam para conquistar um lugar ao sol no futuro mercado automóvel __ Há cada vez mais portugueses a comprar carros eletrificados, quer sejam 100% elétricos ou híbridos plug-in. Nos primeiros sete meses do ano, venderam-se em Portugal 28,6 mil veículos elétricos e 19 mil híbridos plug-in, o que representa, face a igual período do ano passado, um crescimento de 27,2% e 15,2%, respetivamente. Em julho foram cerca de 130 mil os portugueses que utilizaram os postos de carregamento públicos espalhados pelo País, um crescimento de quase 50% em relação ao mesmo mês do ano passado. Nos primeiros sete meses do ano foram “carregados” mais de 100 milhões de kWh ônos veículos elétricos que recorreram à rede pública, um aumento de mais de 60% face ao ano anterior. No espaço de um ano e meio, os carregamentos efetuados na rede duplicaram, passando de 38 mil em janeiro de 2024 para 76 mil em julho de 2025. Apesar deste incremento, ainda existe uma forte desconfiança em relação a este tipo de veículos, sobretudo na hora de proceder ao carregamento na rede pública. A grande maioria dos utilizadores sente que existe pouca transparência no que respeita aos preços na hora de carregar o veículo. Saber, por antecipação, o custo de um carregamento é uma tarefa quase impossível, pois estes incorporam várias taxas e custos que se acumulam ao preço final. Além dos respetivos impostos, na formação do custo final entram o preço da energia vendida pelo comercializador de eletricidade, o preço cobrado pelo operador do ponto de carregamento que pode ser por kWh e/ou por minuto de utilização , e, nalguns casos, uma taxa de ocupação do respetivo posto. Um processo muito pouco transparente que por vezes resulta em surpresas na altura de pagar a fatura, o que afasta muitos condutores da tão ambicionada transição para a mobilidade elétrica. Basta olhar para os números. Segundo O Observatório da Mobilidade Elétrica, o custo médio do carregamento na rede pública para percorrer 100 quilómetros é de 7,94 euros, um valor mais elevado que o de um veículo com motor a gasóleo, que em média gasta 7,54 euros para fazer a mesma distância, e apenas 1,8 euros menos que um veículo a gasolina (9,72 euros). Mas o caso muda de figura para quem consegue carregar o carro elétrico em casa. Para os mesmos 100 quilómetros, o custo médio na tarifa simples de eletricidade é 3,19 euros. Mas, para quem utilize o sistema bi-horário, o preço baixa para 2,11 euros. Ou seja, carregar num posto público custa, em média, três vezes mais do que na tomada de casa. Um fator de peso que pode fazer toda a diferença na hora da decisão de comprar ou não um veículo elétrico. REFORMAR ê PRECISO Para acabar com estas dúvidas, o Governo decidiu no último Con-selho de Ministros aprovar O ônovo Regime Jurídico da Mobilidade Elétrica. Segundo o executivo, o novo diploma irá simplificar o processo de carregamento elétrico ao eliminar a obrigatoriedade de contratos com os comercializadores. No âmbito do documento, os postos de carregamento com potências iguais ou superiores a 50 kWh “passam a ser obrigados a disponibilizar pagamento através de cartão bancário”. Já os de potências inferiores deverão, pelo menos, oferecer a possibilidade de pagamento através de meios eletrónicos alternativos, como QR Code, ou através de NFC , Near,feld Communication, usada para comunicações seguras de proximidade entre, por exemplo, um telemóvel e outro aparelho, neste caso o posto de carregamento. Além disso, o Governo quer que os preços passem a estar disponíveis e “visíveis” de forma “transparente” com o custo por kWh definido, tal como acontece hoje com a gasolina ou o gasóleo nos postos de abastecimento de combustíveis fósseis. O novo regime pretende que sejam reduzidas as taxas pagas pelo utilizador, uma vez que deixam de existir intermediários no processo. E, por outro lado, os clientes da mobilidade elétrica, os comercializadores e os operadores dos postos, deixam de ter a obrigatoriedade de estar ligados à Mobi.E, a entidade gestora da mobilidade elétrica. O objetivo passa ainda por conseguir uma maior liberalização do setor, levando ao aumento da concorrência e contribuindo para o aumento do número de postos de carregamento existentes ôno País. Para o Governo, os operadores de pontos de carregamento também irão beneficiar com este regime jurídico, pois “ganham mais autonomia para gerir os seus pontos de carregamento, podem usar energia de autoconsumo, como painéis solares, passam a ter liberdade para definir os seus modelos de negócio e deixam de estar obrigados a integrar uma rede única” De forma a conseguir uma melhor transição do regime atual, o executivo decidiu estabelecer um regime transitório até 31 de dezembro de 2026. A partir dessa data, todos os postos de carregamentos de carros elétricos terão de obedecer às novas regras em vigor. “Implementar um modelo mais eficiente, com menos intervenientes, logo menos taxas, é uma das novidades deste regime. O Governo quer trazer mais transparência para o setor, desde logo porque os utilizadores têm O direito a uma fatura clara e percetível quando carregam os seus carros”, disse Miguel Pinto Luz, ministro das Infraestruturas e Habitação. Já a ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, considera que O onovo regime permitirá o aumento do número de postos de carregamento e com mais concorrência, “tudo aponta para uma redução dos custos e maior transparência onos preços, nomeadamente nas autoestradas”. A PERDER DINHEIRO Apesar da subida das vendas de veículos elétricos um pouco por todo o mundo, esta é uma atividade que ainda dá muitos problemas financeiros à grande maioria dos construtores de automóveis. No ano passado venderam-se cerca de 17 milhões de novos carros eletrificados, uma subida de 25% que estabelece um novo recorde para este tipo de veículos. Contudo, segundo um estudo recente da empresa de análise Rho Motions, das novas marcas que foram criadas para entrar neste mercado dos veículos elétricos, apenas quatro marcas estão a conseguir margens de lucro positivas. A Tesla é o grande destaque conseguindo uma margem de operação de 7,2%, mas a Rho Motions faz notar que a empresa de Elon Musk tem vindo a perder rentabilidade desde 2023, o que poderá agravar-se ainda mais este ano, depois de se ter verificado uma forte queda nas vendas quando o bilionário decidiu integrar o executivo de Donald Trump. A chinesa BYD é a segunda mais rentável, conseguindo uma margem de 6,4%. Ao longo dos últimos anos, a BYD tem feito uma forte aposta fora do mercado chinês e tem vindo a afirmar-se como um dos grandes “players” da mobilidade eletrificada. As outras duas são ambas chinesas, mas têm algumas particularidades. A Li Auto, por exemplo, dedicou-se a um mercado muito específico que passa por veículos elétricos com extensores de autonomia, ou seja, os carros têm um pequeno motor a combustão que apenas serve para gerar eletricidade para carregar as baterias, aumentando consideravelmente a autonomia. Já O Seres Group, um antigo conglomerado industrial que começou a sua atividade como produtor de componentes para automóveis, controla atualmente uma série de marcas como a Dongfeng, Seres, Fengon, Landian, Ruichi, entre outras, que conseguiram atingir uma forte notoriedade na China, o maior mercado do mundo para os veículos elétricos. Já as restantes, como a Polestar, X-Peng e a Leap Motor, entre outras, ainda acumulam fortes prejuízos e lutam para conseguir conquistar um lugar neste mercado extremamente competitivo. Um outro estudo, este da consultora AlixPartners, admite que, até 2030, das 129 marcas de automóveis nascidas na China, apenas 15 irão sobreviver. A feroz concorrência entre todas, que levou a uma guerra comercial de descida de preços, obrigou mesmo O Governo de Pequim a intervir, apelando a uma “autorregulação” entre os construtores de forma a conseguir estabilizar o mercado. Segundo a AlixPartners, a grande maioria destas novas marcas poderão desaparecer, quer por encerramento das mesmas ou por um fenómeno de consolidação entre os vários construtores, o que poderá dar origem a grupos automóveis ainda mais fortes. A LUTA CONTINUA A forte concorrência destas novas marcas ono mercado internacional tem causado grandes problemas aos construtores de automóveis tradicionais. Apesar dos vaticínios de grandes dificuldades para estes, as marcas têm mantido uma luta constante para lançar novos produtos no mercado da mobilidade elétrica, reduzindo custos, desenvolvendo novas tecnologias para manter a capacidade de concorrência com os novos players que agora chegaram ao mercado. Os últimos números mostram sinais de resiliência entre os grandes grupos. A Mercedes,Benz apresentou os resultados do segundo trimestre com uma forte situação financeira, mostrando um EBIDTA de 1,4 mil milhões de euros e uma margem de lucro (antes de impostos e tarifas) de 6,6%. A empresa alemã prevê dançar mais 25 novos modelos até ao final de 2028, sendo a grande maioria eletrificados. Até ao final do ano, os veículos elétricos irão representar 22% das vendas da Mercedes. Com 4,36 milhões de veículos vendidos ono primeiro semestre, o gigante Volkswagen registou uma ligeira subida nas vendas, atingindo um valor total de 158,4 mil milhões de euros. Contudo, os resultados operacionais desceram devido aos custos com as tarifas norte-americanas, que tiveram um impacto de 13 mil milhões de euros, e as provisões constituídas para a reestruturação em curso nas marcas Audi e vw. “Impulsionado pelo sucesso dos nossos novos produtos, o Grupo manteve a sua posição num ambiente extremamente desafiador. As nossas vendas permanecem estáveis num mercado global competitivo. Na Europa, expandimos a posição de liderança em mobilidade elétrica, com uma quota de mercado de 28%, e as carteiras de encomendas bem preenchidas. Esperamos que a tendência positiva continue ono segundo semestre do ano”, disse Oliver Blume CEO do Grupo Volkswagen Group. Dentro do grupo, o destaque vai para a Skoda que tem vindo a crescer com percentagens acima dos seus concorrentes. No primeiro semestre vendeu 509 veículos, o que representou um crescimento de 13,6% atingindo uma receita total de 15 mil milhões de euros e um lucro operacional de 1,28 mil milhões. Passou a ser a terceira marca mais vendida na Europa. Segundo a empresa, a forte procura por veículos elétricos e híbridos plug-in foi “fundamental para este desempenho”. No mercado europeu, a Skoda vendeu 72 mil veículos elétricos e 21,4 mil híbridos plug-in, o que representou quase um terço das vendas totais. Já a BMW revelou um comportamento misto onos seus resultados. Nos primeiros seis meses do ano, as receitas das vendas de automóveis caíram 8,2% em relação ao mesmo período do ano passado, atingindo OS 67,7 mil milhões de euros. A quebra de 15,5% das vendas no mercado chinês e o impacto das ta-rifas de Trump foram os factos mais impactantes nas contas da empresa alemã, mas, mesmo assim, a BMW ainda mantém uma margem EBIT de 6,2% para o segmento automóvel, maior do que a apresentada por alguns dos seus concorrentes. A aposta recai agora na sua nova plataforma, a Neue Klass, que pretende redefinir a sua linha de produtos ono segmento elétrico, como acontece com O onovo iX3, revelado recentemente na IAA Mobility, em Munique. ARRUMAR A CASA Apesar de uma subida das vendas de automóveis em 1,3% e de uma margem operacional de 6,5%, a Renault reportou um prejuízo de 11,2 mil milhões de euros no primeiro semestre, o que se deve em grande parte à retirada do investimento na Nissan das contas do grupo francês. Só este ato contabilístico causou um resultado líquido negativo de 9,3 mil milhões de euros. "os resultados do primeiro semestre não corresponderam às nossas ambições iniciais. Apesar disso, a rentabilidade do Grupo Renault continua a ser uma referência no setor. Estamos determinados a manter esse padrão", disse François Provost, que tinha sido nomeado o novo CEO do grupo na noite anterior à da apresentação e resultados. A Stellantis, que agrupa várias marcas, entre as quais a Peugeot, Citroên, Fiat, Opel, Jeep, entre outras, registou um prejuízo de 2,3 mil milhões no primeiro semestre do ano, depois de ter conseguido lucros de 5,6 mil milhões no mesmo período do ano passado. “As minhas primeiras semanas como CEO confirmaram a minha forte convicção de que consertaremos o que está errado na Stellantis. 2025 está a ser um ano difícil, mas também de melhoria gradual. A nova equipa de liderança, embora realista quanto aos desafios, continuará a tomar as decisões difíceis necessárias para restabelecer o crescimento dos lucros e melhorar significativamente os resultados”, afirmou Antonio Filosa, O homem que substituiu Carlos Tavares na liderança do grupo. As tendências são mistas e algumas marcas estão a conseguir um melhor desempenho nesta transição para a mobilidade elétrica. Resta saber se, na Europa, o futuro também passará pela consolidação entre as marcas tal como se prevê na China. Vv visao@visao.pt Mobilidade (ainda pouco) elétrica A venda de veículos 100% elétricos ainda fica muito aquém das expectativas das marcas de automóveis. No final do primeiro semestre deste ano, apenas representavam 15,6% do mercado da União Europeia. Em Portugal, um em cada cinco carros vendidos já é totalmente eletrificado 3,4% 8,4% 24% 34,8% 28,4% UNIAO 29% PORTUGAL EUROPEIA 12,9% 9,4% 8,4% 5,5% 15,6% 20,2% Híbridos [ Híbridos Plug-in Elétricos . Diesel Gasolina Outros MAIS PROCURA DE REDE DE CARREGAMENTO A utilização da rede pública Mobi.E continua a crescer de mês para mês, atingindo recordes quer no número de utilizadores, quer no de carregamentos e de energia consumida, como mostram os resultados dos primeiros sete meses deste ano NúMERO DE CARREGAMENTOS ENERGIA CONSUMIDA (KWH) Jan Dez Jan SDez O número de carregamentos na rede ... a quantidade de energia consumida pública Mobi.E cresceu 46,1%.. registou um incremento superior a 60%.. Fontes: ACEA, Mobi.E 2025 2024 MAIS LOCAIS DE CARREGAMENTO A rede de carregamento continua a crescer e Portugal conta já com um total de 6 219 postos espalhados pelo País que oferecem 12 628 tomadas para ligar os veículos Número Número de postos de tomadas Janeiro 5 459 11 002 Fevereiro 5 585 11 142 Março 5 693 11 430 Abril 5 803 11 652 Maio 5 933 11 913 Junho 6 000 12 121 Julho 6219 12 628 NUMERO DE UTILIZADORES a # # Jan F Dez .e e o número de utilizadores alcançou OS 130 mil em julho deste ano Os carregadores elétricos terão de ter o custo por kWh definido, tal como acontece hoje com a gasolina ou o gasóleo nos postos de abastecimento de combustíveis fósseis Das novas marcas criadas para entrar no mercado dos veículos elétricos, apenas quatro estão a conseguir margens de lucro positivas PAULO M. SANTOS