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CORREIO DO LEITOR

Topos & Clássicos

2025-07-28 21:06:51

Faça-nos chegar as suas opiniões, críticas, histórias ou sugestões por e-mail ou através da página de Facebook da Topos & Clássicos. Caro Hugo Reis, Leitor assíduo da vossa revista desde sempre. Pela primeira vez, tomo a iniciativa em vos contactar por carta, pois entendo que tem outra profundidade que o email não oferece. Vem a propósito o artigo da última edição da revista (#271, Maio/junho 2025), “o BMW Art Car português. A história e a primeira vitória”, que li deliciadamente. Gosto muito do universo automóvel, sendo que ao longo dos anos fui alterando o meu interesse em determinados assuntos que me oferecem maior prazer, exactamente o que trata nos dois primeiros parágrafos do seu texto. Este artigo foi o gatilho que me trouxe aqui. Desculpe a ousadia, não consegui conter-me, mas senti uma imensa vontade em partilhar uma história. Creio que irá compreenden. Em 2020 resolvi voltar a estudar e iniciei um Mestrado em Estudos Curatoriais no Colégio das Artes na Universidade de Coimbra. A arte da curadoria, o curador como um mediador entre o artista, a obra e o público. Toda a minha vida profissional é desenvolvida com os automóveis, misturando o puro prazer com a responsabilidade do trabalho. Decorrido o trabalho académico, as aulas teóricas, as visitas e workshops, pequenos trabalhos de grupo, chegou o momento de decidir o assunto. O tema para a investigação e desenvolvimento da dissertação e projecto final. Permanecia na minha cabeça durante todo o tempo, e era para mim mais do que evidente, o cruzamento do automóvel com a arte contemporânea. Senti alguma apreensão por parte do colégio de professores, mas felizmente um dos meus orientadores entendeu e deu-me a liberdade em poder explorar. Havia pensado na literatura, mas à medida que procedia na investigação, outros caminhos se abriam e por isso fui contaminado com outras áreas, nomeadamente a pintura, a escultura, a fotografia, performance, design, arquitectura, BMW Art Cars, tive de parar e começar a concluir. A dada altura fui advertido: “Joaquim Pedro, isto é uma dissertação e não uma tese de doutoramento. Tens de pararl!” ê fácil o entusiasmo, há um mundo que desconhecia e de enorme amplitude. Ao fim de dois anos, a dissertação foi apresentada. O projecto incluía a curadoria e conceptualização de uma exposição no Museu do Caramulo. Visitei a instituição juntamente com um Professor e estive em contacto com o Salvador Patrício Gouveia. Fomos desenvolvendo alguma conversas e um calendário para a possível exposição. Por variadíssimos motivos, acabou por nunca acontecer. Vem isto a propósito pois, quando leio um artigo onde é manifestada intelectualmente a ideia do automóvel integrado num mundo sociológico, antropológico e cultural, em vez do habitual motor, potência e caixa de velocidades, é transformador. Consegui aqui esta intercepção, algo que em conversas com amigos e conhecidos nunca consegui obter. Bem Haja! E termino, já vai extensa esta carta. Fui desafiado pelo meu filho (estudante de Belas Artes Design Gráfico, para um projeto académico de uma cadeira deste semestre) a fazermos um livro. O mote foi a comemoração dos 70 anos do Citroên DS, esse ícone da indústria automóvel. Um livro de autor. Artístico. Não um livro de história. Caso manifeste interesse, terei o maior prazer em apresentar e oferecer um exemplar (em fase final de acabamento). Despeço-me e agradeço antecipadamente a sua atenção na esperança que não tenha sido demasiado maçador. Muito Obrigado. R: Caro Joaquim, Antes de mais, tenho sempre de manifestar uma enorme alegria de cada vez que alguém resolve fazer uso deste “cantinho” que é o Correio do Leitor e que, por questões de transformação dos nossos hábitos, tem cada vez menos participação. Estou-lhe grato por isso e por encontrar valor neste meu “mergulho” no cruzamento entre a arte e o automóvel, a propósito do BMW M3 E30 que milita no nacional de Velocidade Legends. O mérito é, no entanto, do meu amigo Luís Liberal, que ao ter esta brilhante ideia de assim decorar o magnífico BMW, revelou não só sensibilidade artística, como também uma respeitável cultura automobilística. Tal como Hervé Poulain, o Luís agitou as águas e pôs pessoas normalmente indiferentes às corridas a olhar com outros olhos para esta obra de arte viva e para o seu “habitat”, ou seja, as pistas. Penso que, de cada vez que alguém resolve juntar os pontos entre o automóvel, a antropologia, a sociologia e a arte, tal como o Joaquim fez com o seu trabalho académico, o mundo automóvel ganha, mas também a sociedade. Pois se esta não for capaz de reconhecer e valorizar a riqueza conceptual, intelectual e transformadora que o automóvel encerra, renega a capacidade de se interpretar e de apreciar os seus próprios feitos, em nome de um falso progressismo. Assim, lamento que essa exposição não tenha ido para a frente e espero que, em algum momento e contexto possa surgir essa oportunidade. Quanto ao livro artístico em torno do Citroên DS, saiba que tem aqui assegurado um canal de promoção dessa obra, pois sentimos que é o nosso dever promover tais iniciativas, especialmente se nascidas por cá. Agradecendo uma vez mais a sua carta, fico a aguardar notícias suas. Cumprimentos, H.R. Joaquim Pedro Oliveira