MORREU O POETA, ENSAÍSTA E TRADUTOR FERNANDO GUIMARÃES
2025-07-11 19:49:07

O escritor natural do Porto tinha 97 anos e sempre quis que a sua obra pudesse dizer alguma coisa aos outros. O premiadíssimo poeta, ensaísta, tradutor e crítico literário Fernando Guimarães morreu na quinta-feira, aos 97 anos, na sua casa no Porto, soube o PÚBLICO junto de fonte da família. Em 2020, Fernando Guimarães foi o vencedor da Grande Prémio de Literatura dst com a obra Junto à Pedra, com o qual já havia ganho o Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores. O poeta recebeu também o Grande Prémio de Poesia APE pelo livro Na Voz de um Nome, em 2007, e pela obra O Anel Débil, em 1992. As suas obras foram ainda galardoadas com o Prémio D. Dinis (em 1985), da Fundação Casa de Mateus, o Pen Clube (em 1988) e o prémio da Fundação Luís Miguel Nava (em 2003). Em Março passado, recebeu o Prémio Vida Literária Vítor Aguiar e Silva, uma distinção instituída pela Associação Portuguesa de Escritores com o apoio do Município de Braga, "pelo rigor e a coerência da reflexão ensaística e do seu trabalho poético". Na área da narrativa publicou As Quatro Idades e O Outro Lado do Desenho e na do teatro Diotima e as Outras Vozes. Traduziu para português obras de Lorde Byron, Shelley, John Keats, Dylan Thomas e D.H. Lawrence. E como ensaísta escreveu sobre literatura, poesia portuguesa, filosofia da arte., destacando-se A Poesia da Presença e o Aparecimento do Neorrealismo, a Linguagem e Ideologia, Simbolismo, Modernismo e Vanguardas e Os Problemas da Modernidade, A Arte é Conhecimento? ou A obra de Arte e o seu Mundo. Foram-lhe atribuídos pela Fundação Calouste Gulbenkian e pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra prémios de tradução de poesia e a Universidade de Évora concedeu-lhe o Prémio Vergílio Ferreira pelo conjunto da sua obra ensaística. Foi investigador do Centro de Estudos do Pensamento Português da Universidade Católica Portuguesa, trabalhou durante vários anos como investigador do Centro de Estudos de Literatura da Universidade do Porto, a convite de José Augusto Seabra, e foi crítico literário da revista Colóquio / Letras e do Jornal de Letras. Em Fevereiro passado, as Edições Afrontamento publicaram Sobre a Voz onde escrevia "Quantos são os passos que damos para encontrar/ a noite? Não tenhas pressa, ela espera-te;/ sentes o odor do corpo que te veste, a luz/ que guardas ainda nos teus olhos. Há alguém/ a aproximar-se/ porque és a sua ausência. Descansa,/ guarda nas mãos entreabertas o que seja um pouco/do seu calor para depois adormeceres. A noite/ vem acompanhar-te,/ com o mesmo rumor/que é o de alguns passos. Sempre a procuraste/ desde a infância. Os caminhos do corpo." Foi em 1956 que o escritor que nasceu em Cedofeita, no Porto, em 1928, viu editado o seu primeiro livro de poesia, Face junto ao vento. Uns anos antes, quando era estudante do curso de Ciências Histórico-Filosóficas da Universidade de Coimbra, onde leccionou Filosofia em várias escolas do ensino secundário, tinha publicado os primeiros poemas revista Eros. Casa: o seu Desenho (1985), As Mãos Inteiras (1971), Tratado de Harmonia (1988), A Analogia das Folhas (1990) e Lições de Trevas (2002). Em 2007, lamentava numa entrevista a Maria José Oliveira ao PÚBLICO, que a poesia contemporânea não encontrasse um público alargado: "Nos tempos do Romantismo havia um maior contacto com a poesia, talvez por esta ser muito subjectiva e emocional. Ia ao encontro das preocupações e da sensibilidade do público", dizia. "A natureza de uma linguagem como a poética tende para o rigor e para uma densidade que exige do público uma maior reflexão. E a reflexão talvez não seja uma virtude da generalidade das pessoas", defendia na altura o escritor. Explicava também que procurava fazer aquilo que considera ser a obra necessária para si. "Procurei fazer aquilo que, para mim, seria uma obra necessária. Não para os outros, mas para mim. Mas se ela puder dizer qualquer coisa aos outros, se abrir um caminho de comunicação, então sentir-me-ei feliz. Mais nada." tp.ocilbup@ohnituoc.lebasi Isabel Coutinho