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GUERRAS - CONFLITOS COM DÉCADAS, SEM SOLUÇÃO OU VONTADE DE OS RESOLVER

Expresso

2025-06-20 06:00:08

No capítulo das disputas territoriais entre países, há altercações que perduram anos a fio como que se esse estado de guerra permanente fosse a norma. Um caso evidente é o conflito entre a Índia e o Paquistão na região de Caxemira, aceso desde 1947. Outro braço de ferro que se arrasta no tempo tem no centro Nagorno-Karabakh, que poucos conseguirão assinalar no mapa. Esta disputa entre a Arménia e o Azerbaijão constitui a última contenda ativa no território da ex-União Soviética, que se desintegrou vai para 34 anos. A 13 de março passado, Arménia e Azerbaijão anunciaram a obtenção de um acordo de paz para o conflito nesse enclave de maioria arménia rodeado por território azeri, aberto desde 1988. “Neste tipo de conflitos muito longos, basta um pequeno reequilíbrio nos apoios externos para que, no terreno, a situação mude radicalmente”, diz ao Expresso Pascoal Pereira, professor na Universidade Portucalense. “O maior ou menor ascendente que a Rússia foi tendo na região ajuda a perceber estes desenvolvimentos. A Rússia, apesar de próxima da Arménia (que depende muito de Moscovo), foi durante muito tempo mediadora do conflito. Nos últimos anos, parece ter havido um desinteresse crescente, o que fragilizou a Arménia perante o Azerbaijão.” A paz após um processo de limpeza étnica Dois factos podem justificar o distanciamento da MUNDO Rússia relativamente à Arménia: a monopoliza-DE 123 ção da agenda política de Moscovo pela guerra na DE Ucrânia e a aproximação da Arménia em relação FORAM DESLOCADAS à União Europeia com vista à adesão. À O desfecho do conflito precipitou-se a 19 de setembro de 2023: o Azerbaijão atacou e ocupou Nagorno-Karabakh. Numa semana, mais de 100 mil arménios fugiram dali. “A remoção da totalidade da população de uma determinada região torna-se rapidamente um facto consumado , independentemente do óbvio ato criminoso”, diz Pereira. “AsreivindicaçõesterritoriaispelaArménia,independentemente da sua justeza, ficam automaticamente mais frágeis por já não haver uma população a quem garantir proteção. Diferentemente de uma derrota militar ou de um cessar-fogo, em que as partes em conflito, ganhando tempo, podem reunir MAIS novas forças ou apoios, a limpeza étnica esvazia a MILHÕES continuidade do conflito, de forma perversa.” ArPESSOAS ménia e Azerbaijão têm ainda de passar o acordo para o papel. Até lá, a paz não está adquirida. FORÇA mmota@expresso.impresa.pt Rohingyas, um povo sem estatuto e sem chão COM ESTADO, SEM RECONHECIMENTO PALESTINA A independência da Palestina foi declarada a 15 de novembro de 1988, em Argel, pelo líder da Organização de Libertação da Palestina (OLP), Yasser Arafat. O texto da Declaração foi redigido pelo poeta palestiniano Mahmoud Darwish. Hoje, 147 dos 193 membros da ONU reconhecem a Palestina. Em 2012, a Assembleia-Geral da ONU aprovou a sua adesão como Estado observador não-membro. SARA OCIDENTAL A 27 de fevereiro de 1976, a Frente Polisário proclamou a independência da República Árabe Sarauí Democrática (RASD), desde Bir Lehlu, aldeia do território do Sara Ocidental. Hoje, o Estado sarauí é membro de pleno direito da União Africana. Já o povo vive disperso entre o território ocupado por Marrocos (cuja anexação é reconhecida por EUA e Israel), em campos de refugiados na região argelina de Tinduf e na diáspora. TRÊS REUNIFICAÇÕES REFÉNS DA GEOPOLÍTICA China e Taiwan ^ 1949 No fim da guerra civil chinesa, os derrotados (nacionalistas) fugiram para a ilha de Taiwan, onde estabeleceram a República da China. Desde então, a China Popular (comunista) persegue a integração dessa “província renegada” para consolidar o projeto político de uma “China única”. Os Estados Unidos apoiam Taiwan como forma de fragilizar a China. Coreia do Norte e Coreia do Sul ^ 1953 A guerra entre as Coreias terminou com um armistício e a península dividida em dois países, com o mesmo povo separado pelo paralelo 38. Desde então, a retórica de Pyongyang e Seul alterna entre o desejo e a rejeição da reunificação, consoante quem está no poder e o estado do mundo. Chipre grego e Chipre turco ^ 1974 A invasão turca dividiu a ilha em duas entidades: a República de Chipre (de maioria grega) é membro da UE e da NATO e a República Turca de Chipre do Norte (maioria turca) só é reconhecida pela Turquia. O congelamento do processo de adesão da Turquia à UE bloqueou a resolução do problema. O MAIOR POVO SEM ESTADO Se o Curdistão fosse um país, teria sensivelmente o formato do mapa, o que implicaria anexar terras de países à volta. Os curdos andarão à volta de 45 milhões. Na Alemanha, serão mais de um milhão. São muçulmanos de maioria sunita, não são árabes (ainda que Saladino, o herói dos árabes, fosse curdo) e têm uma língua própria. No Médio Oriente, enfrentam realidades distintas. Na Turquia, o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) é rotulado de terrorista por Ancara, EUA e UE, dado o histórico de ataques. No Irão, há uma província chamada Curdistão. No Iraque, gozam de ampla autonomia no norte. E na Síria, as Unidades de Defesa Popular (YPG) foram cruciais para derrotar o Daesh. DATAS-CHAVE PARA A AUTONOMIA DO TIBETE 1913 O 13º Dalai Lama, líder político e espiritual do povo tibetano, proclama a independência do Tibete, após o fim da dinastia Qing, na China. O país dota-se de bandeira, moeda e passaporte. 1951 Após a recém-fundada China Popular invadir o Tibete, os dois Governos assinam um acordo que afirma a soberania chinesa sobre o território e o direito dos tibetanos à autonomia. 1989 Tenzin Gyatso, o 14º Dalai Lama, recebe o Nobel da Paz “por defender soluções pacíficas”. Tinha teorizado o “caminho do meio”, abordagem que aceita a autonomia regional para o Tibete. PERSEGUIÇÃO Os rohingyas a minoria muçulmana de Myanmar, país de maioria budista nunca teve vida fácil, nem quando o Estado ainda se chamava Birmânia (até 1989). Em 1982, uma nova Lei da Cidadania excluiu-os da lista de 135 minorias reconhecidas. Odiados, discriminados e perseguidos, foram fugindo do país vítimas de sucessivas vagas de repressão das forças governamentais. Em agosto de 2017, protagonizaram o êxodo humano mais rápido desde o genocídio do Ruanda (1994). Em poucos dias, mais de 700 mil fugiram para o Bangladeche. Hoje, mais de um milhão sobrevive em campos de refugiados no país vizinho (como o de Ukhiya, na foto). Para aliviar a pressão demográfica, o Governo de Daca transferiu milhares para a ilha de Bhasan Char. Ao contrário de outros povos, os rohingyas não reclamam um Estado próprio: querem apenas viver no seu país. MARGARIDA MOTA