REPORTAGEM - HÍBRIDOS PLUG-LN EM XEQUE
2024-05-31 21:15:08

Reportagem. Estudo da União Europeia conclui que os híbridos com tecnologia de recarga externa da bateria emitem mais 350% de CO2 que os números declarados pelos fabricantes. Preocupante, considerando que os PHEV estão de novo no topo das prioridades, com o abrandamento na procura de elétricos! Condutores usam-nos incorretamente. Os resultados do primeiro ano de registo de emissões poluentes em híbridos Plug-ln (PHEV), em condições reais de utilização, são preocupantes, confirmou a União Europeia (estudo que compara os pelos fabricantes de automóveis em laboratórios, de acordo com as normas inscritas no protocolo WLTP, e os apurados na condução quotidiana. Neste trabalho de campo realizado em 2021, equipamentos de monitorização dos consumos montados em 600.000 automóveis. As conclusões são surpreendentes, considerando, sobretudo, as diferenças muito significativas entre os números homologados e os registados pelos investigadores que trabalharam no projeto. Por exemplo, no caso dos híbridos com tecnologia de recarga externa das baterias (Plug-ln ou PHEV), as emissões de dióxido de carbono (CO2) excederam em mais de 350% os dados das marcas, certamente por muitos condutores utilizarem a tecnologia incorretamente e percorrerem muitas dezenas ou centenas quilómetros sem energia nas baterias e utilizando apenas os motores de combustão interna. Nos automóveis com mecânicas a gasolina ou gasóleo, as diferenças são menos relevantes, mas, ainda assim, em média, emissões de CO2 20% acima dos valores homologados (e comunicados...). Neste documento da Comissão Europeia (CE), PHEV em xeque. E os responsáveis são os condutores, por utilizarem mal, quando não desprezam ou ignoram, todo o potencial do sistema. “Na maioria dos casos, os automóveis não são carregados e conduzidos de forma totalmente elétrica com a frequência pretendida”, escrevem os redatores do relatório. Os números são taxativos: no primeiro ano do estudo de monitorização, nos modelos com motores a gasolina, 145 g/km de CO2, de média, de acordo com o protocolo de homologação (WLTP), 180 gramas na realidade; nos Diesel, respetivamente, 153 e 181; nos híbridos Plug-in, 40 gramas contra 139! As conclusões do relatório são preocupantes, por comprometerem investimentos numa tecnologia apresentada pelos fabricantes como alternativa muito válida aos elétricos, desde logo por aliviar o utilizador da sensação de desconforto associada às autonomias (mais) limitadas dos automóveis que têm apenas baterias. Mais: as gerações novas de híbridos Plug-ln têm acumuladores de energia muito maiores e, por isso, percorrem mais quilómetros com as mecânicas térmicas desligadas, em silêncio, anunciando-se até níveis de emissões de CO2 tão reduzidos como cerca de 20 g/km. Dados da Associação de Construtores Europeus (ACEA), revelam que os PHEV, atualmente, são ainda mais procurados que os BEV, por representarem a tecnologia de transição mais adaptada às exigências e necessidades da mudança de paradigma no automóvel, do motor térmico para o elétrico. Tecnologia recupera fôlego Atualmente, na Europa, assiste-se a movimento interessante, com muitas marcas a anunciarem marcha-atrás nos programas de eletrificação, adiando a introdução de automóveis 100% elétricos para privilegiarem a tecnologia PHEV, sobretudo no mercado do luxo. Bentley e Land Rover, por exemplo, encontram-se nesta posição. Depois de três anos de crescimento rápido na procura, os elétricos estagnaram, o que não liberta os fabricantes de reduzirem, drasticamente, as emissões de CO2! Inicialmente, antecipava-se que o interesse pelos PHEV diminuiria à medida que o preço do automóvel elétrico baixasse e os incentivos à compra de híbridos Plug-ln também abrandassem (ou desaparecessem), mas a tecnologia mantém quotas de mercado importantes, registando-se até aumento na procura acima do que está a verificar-se nos modelos equipados apenas com baterias. Ola Kallenius, diretor da Mercedes, confirma esta tendência. “Na nossa opinião, a tecnologia manter-se-á relevante durante muitos anos”, disse. Na geração nova de PHEV da marca da estrela, a exemplo do que acontece noutros fabricantes, como o Grupo VW, híbridos Plug-ln capazes de percorrerem mais de 100 km apenas com a energia na bateria. Na Bentley, idem, aspas... Adrian Hallmark, que está de saída para a Aston Martin, confirma-o: “Era suposto que a venda de híbridos abrandasse em 2028,2029 e 2030, mas os indicadores que temos dizem-nos que a procura vai aumentar. E esta tendência, confirmando-se, cria-nos oportunidades de negócios e, sobretudo, protege-nos contra uma adoção mais lenta dos elétricos”. Sistemas de monitorização a bordo A tecnologia PHEV tem muitos críticos, precisamente pelo facto de os números de laboratório nunca coincidirem com os reais. E este relatório da CE confirma-o. “Os pressupostos utilizados para a homologação europeia WLTP não são válidos numa condução em condições reais, no quotidiano», concluem os relatores. Em 2023, a instituição Transport & Environment com sede em Bruxelas, próxima da Comissão, denunciou-o: «Vendem-se os híbridos Plug-ln como uma combinação perfeita, por contarem com bateria que safistaz as necessidades de mobilidade nos ambientes urbanos e motor térmico que permite percorrer distâncias maiores, mas os testes provam a fórmula está errada e nunca funciona. Os consumos de combustível são três a cinco vezes superiores aos anunciados». Desde janeiro de 2021, todos os automóveis novos vendidos na Europa, incluindo os comerciais ligeiros, estão obrigados a contarem com sistemas de controlo que registem quer os consumos de combustível, quer os quilómetros percorridos, mas o equipamento não elimina o problema reconfirmado pelo relatório da CE, que foi redigido após análise e interpretação dos dados de 600.000 automóveis entregues pelos fabricantes - no total, receberam-se 988.231 registos, o que representa 11% das vendas na EU durante esse ano, mas considerou-se apenas aquela amostra. De regresso aos números inscritos nas conclusões do documento, nos modelos a gasolina e gasóleo, as emissões de CO2 reais excederam os números anunciados em 28 a 35 g/km, o que significa, teoricamente, até mais 1,5 1/100 km de consumo de combustível. Todavia, a CE diz tratar-se de estimativa, devido à impossibilidade de reproduzir em laboratório todos os fatores que influenciam os resultados reais, nomeadamente o comportamento do condutor, a fluidez do trânsito e a utilização do ar condicionado. Já nos PHEV, adotando-se a mesma fórmula de interpretação, mais 100 g/km - ou 4 1/100 km! Nos híbridos Plug-ln (gasolina e gasóleo), média de 39,6 g/km de CO2 na homologação WLTP, registo muitíssimo abaixo das 139,4/km na utilização quotidiana, o que corresponde só a menos 23% que os automóveis a gasolina e gasóleo. Qualidade da informação preocupa No documento publicado pela CE e a que E-AUTO teve acesso, temos, também, a preocupação dos relatores com a qualidade dos dados comunicados pela maioria dos fabricantes de automóveis, o que tem impacto nos cálculos e nas conclusões. Neste item, Jaguar Land Rover, Mercedes e Volvo destacaram-se positivamente: a primeira comunicou os registos de 43% da frota, a segunda de 27% e a terceira de 24%. Nos PHEV, no topo da tabela da transparência, Mercedes (39%), Volvo (19%) e Ford 16%. A generalidade das marcas informou sobre 5% ou menos!... “Todas as informações sobre emissões são importantes, mas a verdade é não recebemos os dados que esperávamos e, por isso, os números são muito pouco representativos e não permitem que cheguemos a quaisquer conclusões definitivas”, lê-se. Mas, menos mal. De acordo com a CE, a introdução da norma WLTP, que remonta a 2017, reduziu para cerca de metade a diferença entre as emissões homologadas e as reais, na comparação com o protoloco NEDC utilizado anteriormente. Para os cálculos, os híbridos Plug-ln beneficiam de um bónus representativo da expetativa de distância a percorrer de forma elétrica, de 70 a 85% do tempo de condução. E o estudo, sem surpresa, por saber-se que apenas os automóveis novos e equipados com a geração mais moderna da tecnologia conseguem fazê-lo, concluiu que esta fórmula de medição das emissões está errada. Segundo o grupo de trabalho, para resultados mais fiáveis, PHEV com níveis de CO2 três vezes maiores. Entretanto, o item passou por processo de revisão, mas a fórmula nova de cálculo tem início de aplicação planeado apenas para 2025, nos ligeiros de passageiros. A CE, no fim do ano, até admite revê-la outra vez, depois de analisar os números mais recentes de programa de monitorização dependente das informações fornecidas por todos os fabricantes. Uns aceleram, outros travam Os híbridos Plug-ln regressaram à agenda por registarem aumento considerável na procura nos primeiros meses de 2024, movimento que coincidiu com redução nas vendas de elétricos. Muitos fatores explicam a situação, mas os analistas do setor, no imediato, acreditam mais no potencial na tecnologia de transição montada nos primeiros. O fenómeno sente-se na Europa e em Portugal. Na UE, nos primeiros três meses de 2024, mais PHEV, menos BEV. Em Portugal, no mesmo período, os primeiros progrediram 25,9%, para 12,2% das matrículas, e os segundos 17,7%, para 16%. Também por isto, números rigorosos, precisam-se! Emissões poluentes diminuem, multas da União Europeia também A cruzada da União Europeia (UE) contra os combustíveis fósseis não é nova e, em 2020, impuseram-se objetivos muito ambiciosos de redução tanto dos consumos como dos gases de escape que obrigavam à massificação das vendas de modelos eletrificados (híbridos ou elétricos), por pressuporem o pagamento de multas, nos casos de incumprimento. E as coimas, sabemo-lo agora, atingiram os 510 milhões de euros, com dois consórcios no topo da tabela dos mais penalizados: Grupo VW e Jaguar Land Rover. 0 Grupo VW, pela violação dos limites muito restritivos introduzidos em 2020, teve de pagar mais de 100 milhões de euros, mesmo ultrapassando o máximo imposto pela UE apenas em 0,75 g/ km, enquanto a Jaguar Land Rover, que excedeu o limite em cerca de 3 g/ km, desembolsou cerca de 40 milhões de euros. A primeira vende muitos mais automóveis do que a segunda, o que explica a diferença na dimensão de coimas calculadas com base no número de automóveis novos comercializados por cada fabricante. Em 2020, Bentley, Lamborghini, McLaren, Subaru ou Suzuki, por exemplo, também ficaram acima do limite, mas as coimas que tiveram de pagar não são conhecidas. No caso da Suzuki, incumprimento de 10,4 g/km (e multa na ordem dos 1000 EUR por automóvel vendido); ora, como a marca nipónica matriculou 160.570 viaturas, diz-se que entregou cerca de 160 milhões de euros à UE! Já a Subaru excedeu o limite em 34 g/km, registou 16.176 carros e a violação custou-lhe 52 milhões de euros. A Tesla, em contrapartida, ganha muito dinheiro com o facto de todos os fabricantes comercializarem poucos elétricos e disporem de acesso a mercado que permite a negociação de emissões, com os norte-americanos como parceiros privilegiados! 0 objetivo da UE de C02 para 2020, para a frota automóvel de cada fabricante, era de 95 g/km, de acordo com o protocolo de homologação NDEC (120 g/km, no caso do WLTP), com a premissa de admissão de emissões maiores nos automóveis que pesassem mais. 0 regulamento também permite associações de marcas e muitas acordaram parcerias com concorrentes que números maiores de carros elétricos. Por exemplo, em 2021, Jaguar Land Rover e Honda somaram-se à Tesla, enquanto o Grupo VW decidiu combinar-se com a SAIO, a proprietária chinesa da MG. Esta estratégia, combinada com o aumento da procura de híbridos e elétricos, fez com que quase todos os fabricantes cumprissem os limites de C02 impostos para 2021, pois a UE, em coimas, cobrou somente 10 milhões de euros. Em 2022, entre os 91 construtores registados na região, apenas a Bugatti não cumpriu o objetivo - no entanto, como vendeu apenas 30 automóveis, escapa ao pagamento de multa! Para o quadriénio 2025-2029, descida de 15% na média das frotas, para 93,6 g/km (WLTP). Depois, no período 2030-2034, menos 55% de CO2, comparativamente ao máximo de 2021, para 49,5 g/km. Por fim, em 2035, luz verde ao comércio apenas de automóveis sem emissões poluentes e mudança dos motores térmicos para os elétricos. Muitos construtores contestam os planos da UE e reclamam alívio das regras, mas a mudança de paradigma no automóvel está em marcha - cada vez mais rápida! TESTES EM LABORATÓRIO CONTRA CONDUÇÃO REAL Motorização vai. WLTP (g/km) C02 vai. reais (g/km) Gasolina 145 180 Gasóleo 153 181 PHEV 40 139 JOSÉ CAETANO